Divergência entre ministros acerca de preços controlados é a mais recente evidência de que falta planejamento nas ações do governo
Se há uma característica marcante do governo Dilma Rousseff (PT) é a reduzida capacidade de, ao mesmo tempo, lidar com os problemas do dia e dia e elaborar planos para o horizonte de longo prazo --que sempre sai sacrificado.
O termo "estratégico" poucas vezes resguarda seu sentido verdadeiro quando empregado pela equipe da presidente. Em geral, não passa de disfarce retórico para ações emergenciais, malpensadas e, por que não, eleitoreiras.
Veio do ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, o exemplo mais recente. Em entrevista a esta Folha, ele disse que o governo segura preços em função do "interesse estratégico da economia", no que se viu desmentido pelo colega Guido Mantega (Fazenda).
O diálogo não deve nada às melhores farsas. Mercadante reconhece o óbvio, mas tenta dar-lhe caráter excepcional; Mantega, por sua vez, nega o evidente, como se tarifas não estivessem sendo controladas no intuito de conter a inflação.
Seria curioso ouvi-los sobre o setor elétrico. Enquanto Dilma assumiu em público o compromisso de reduzir a conta de luz, as medidas subsequentes demonstraram que houve pouca estratégia envolvida.
É notória a truculência da intervenção nessa área em 2013 --para o governo, ainda assim, um processo indolor. Várias empresas geradoras optaram por não renovar concessões; houve disputa sobre o valor a ser reembolsado por ativos ainda não totalmente depreciados.
Depois, a falta de chuvas forçou o uso das térmicas, mais caras, e elevou o custo da energia. O governo recorreu a malabarismos financeiros a fim de deixar reajustes para 2015.
Há ainda o caso da gasolina. Com o preço represado, é vendida pela Petrobras no mercado interno por valor abaixo de seu custo de importação. Debates entre a própria estatal e o governo deixam claro a "estratégia": defender a popularidade presidencial.
A falta de planejamento assoma também na proposta de aumentar impostos sobre cerveja e refrigerantes. Adiada sucessivas vezes, deveria entrar em vigor no dia 1º de junho. Agora, sensível ao argumento de bares e restaurantes de que haveria alta de preços às vésperas da Copa do Mundo, a presidente determinou um novo atraso, desta vez até 1º de setembro.
A trapalhada protagonizada pelos ministros Aloizio Mercadante e Guido Mantega poderia ser apenas um detalhe cômico. É, contudo, mais relevante do que isso --indica com precisão a ausência de pensamento estratégico no governo.