O mundo inteiro ficou chocado com os atentados que, na sexta-feira (13), mataram e feriram mais de uma centena de indivíduos, em Paris. Onde quer que ocorressem, tais atos de selvageria teriam horrorizado as pessoas, mas, em Paris, ganharam um grau particular de afronta ao mundo civilizado, por ser aquela uma cidade símbolo do culto às artes e à liberdade. Tudo leva a crer, portanto, que aquela não foi uma escolha eventual dos terroristas islâmicos, e sim a explícita e desvairada manifestação de que seu propósito é pôr fim ao mundo civilizado.
Pode parecer exagero, uma vez que não será o assassinato absurdo de inocentes e a explosão de casas de espetáculos e restaurantes que os conduzirá ao seu delirante objetivo. De qualquer modo, movidos por esse propósito, submetem ao terror uma nação inteira.
Se há uma coisa difícil de evitar é atentado terrorista. É verdade que a frequência dessas ações termina por oferecer ao agredido elementos que o ajudarão a prever e se antecipar a novos ataques, mas anulá-los definitivamente é quase impossível, enquanto o núcleo gerador dos ataques se mantiver atuante.
No caso do Estado Islâmico, a coisa é mais complicada ainda, por envolver jovens de origem muçulmana, alguns dos quais nascidos na Europa, mas que, por sua formação religiosa, são facilmente cooptados pelos terroristas e passam a seguir suas decisões. Os atentados em Paris deixaram isso bem claro. Os terroristas que dele participaram eram descendentes de árabe, que o Estado Islâmico cooptou e adestrou ideológica e militarmente para atacarem o país (ou países) onde nasceram e onde vivem.
Não li nada sobre isso, mas acredito que, se a escolha do objetivo deve partir dos dirigentes do Estado Islâmico, o planejamento e a execução são obra dos grupos que realizam os atentados. Esses são, na verdade, fiéis seguidores de uma concepção de islamismo caracterizada por fanatismo delirante, conforme o qual quem não adere a ele deve morrer.
Não se trata apenas de um princípio doutrinário, e sim de uma prática que tem sido executada de modo implacável, como demonstram as frequentes execuções de "infiéis" que não aderem a esse fanatismo. Milhares de muçulmanos dos povoados e cidades que o Estado Islâmico ocupou foram sumariamente executados em nome de Alá.
Por outro lado, se os terroristas não respeitam a vida alheia, tampouco se apegam à sua própria, como demonstra a frequência como se suicidam, detonando as bombas que trazem presas ao corpo. Há, porém, uma diferença entre os dois tipos de mortes: os infiéis, que eles executam, vão para o inferno, enquanto eles, os suicidas, vão para o seio de Alá, onde os esperam 72 virgens, para cada um. Não estou dizendo nada de novo; ao contrário, apenas repito o que todo mundo sabe e que eles próprios alardeiam.
Por isso mesmo, causou-me surpresa a opinião de alguns comentaristas nos jornais e na televisão, segundo os quais os atentados terroristas ocorridos em Paris teriam sido consequência da discriminação com que são tratados, na França, os descendentes de árabes. Ou seja, a culpa pelos atentados, no fundo, cabe às vítimas, e não aos terroristas. Claro, os tais comentaristas não aprovavam os atentados, mas sugeriam que, se os imigrantes tivessem sido melhor tratados pelos europeus, nada daquilo teria acontecido.
É verdade que, em seus comentários, não afirmaram isso claramente, mas é o que estava implícito em seus argumentos. Certamente, ninguém vai negar que haja, na França, como em outros países europeus, discriminação contra imigrantes, sejam eles árabes, africanos ou latino-americanos. Isso, porém, não justifica o assassinato de alguém, muito menos de centenas de pessoas, que os terroristas nem sabem quem são, algumas das quais nem francesas eram. Terrorismo não pode ser justificado em qualquer hipótese.
Não sei bem o que leva pessoas inteligentes e informadas a adotarem tal posição. Admito que a chamada civilização ocidental não prime sempre pelo amor ao próximo e o respeito à vida. Ainda assim, já de há muito renegou o terrorismo como modo de afirmar suas convicções. Fundamental é olhar os fatos com isenção.
Folha