Manifestante segura carta na manifestação Acorda Maranhão |
Médicos e profissionais da área de saúde do Hospital das Clínicas de São Paulo localizam no Maranhão a situação que gerou uma piada que circula na internet desde a semana passada, após a presidente Dilma Rousseff anunciar em rede de televisão e rádio que importará médicos estrangeiros para suprir a carência de profissionais da área no país.
Na edição da Folha de S. Paulo desta quarta-feira,3, a colunista Cláudia Collucci sedimenta a piada no artigo "Barreira da Língua". Segundo afirma Collucci, o chiste circula no maior hospital da cidade, um monumento à ineficiência da saúde pública e eventualmente da privada no país. Sem graça, o witz (gracejo em alemão) sobre o paciente maranhense é o ponto de partida para a análise falso negativa de uma situação muito mais complexa e insuportável em um artigo de poucas linhas.
Pelo visto, a colunista com sobrenome de sotaque italiano faz parte do grupo de habitantes da região "sul" (contraponto ao indiscriminado cardeal Norte ou, mais pejorativamente, paraíba, designando nascidos acima de Minas). Para a colunista, o Brasil poliglota contrasta com os rincões.Em defesa da medicina tupiniquim, a colunista cauteriza a segregação regional, uma doença diagnosticável, embora lamentavelmente incurável.
Léguas tiranas distante dos consultórios médicos do SUS e alhures, a colunista da Folha acredita ser imprescindível o diálogo entre médico e paciente na produção de um diagnóstico preciso. Crente ela é que horas após longas esperas em centrais de marcações de consultas, invariavelmente se iniciando na madrugada, pacientes deixam gabinetes médicos com receitas prescritas em tipologias vistosas impressas em jatos de tintas, lazer ou escritas à mão em caligrafias decifráveis.
Argumenta a colunista que a língua é o tecido mais delicado para barrar a importação de médicos. Frustrantes experiências na Alemanha são parâmetros exemplares tomados pela colunista para desbancar a aptidão para o trabalho de um médico estrangeiro em terras brasilis.
Há estudos acadêmicos que afirmam existir ao menos 15 dialetos falados no território do Brasil. Aqui no Maranhão, por exemplo, se compra e come dois pastéis. Em São Paulo seriam dois pastel. Isso com todo orgulho do sangue italiano correndo em suas veias. Por fim, ambos comem igualmente, embora nutrindo diferentes culturas. E isso não é da conta dos nortistas de vida escarpada, naturalizados paulistanos, anos após anos erradicados na terra da garoa.
Sobre a língua deveria ela buscar o Maranhão no google e descobrir que os mais nobres representantes da literatura brasileira e outrora orgulhávamos de pronunciar o melhor português do país. Nomes como Sousândrade, Gonçalves Dias, Ferreira Gullar e outros tantos e tantos que afiam a língua pátria talvez até poderiar descortinar seu horizonte de colunista
Hasta la vista, baby.
Leia abaixo - Barreira da Língua - Cláudia Collucci
SÃO PAULO - Cenário: um posto de saúde no interior do Maranhão.
--Buenos dias, señor, o que siente?-- pergunta o médico.
--Tô com dor no bucho, comi uma tapioca reimosa, me deu um empachamento danado. Minha cabeça ficou pinicando, deu até um farnizim no juízo.
--Butcho? Tapiôka? Empatchamiento? Pinicón? Far new zeen???
O trecho acima é de uma piada que circula no Hospital das Clínicas de São Paulo sobre as dificuldades de comunicação que os médicos estrangeiros deverão enfrentar nos rincões do Brasil.
A barreira da língua e dos regionalismos parece um mero detalhe em meio a tantas outras questões mais sérias já levantadas, como a falta de remédios, de equipes e de infraestrutura, mas não é.
Como é possível estabelecer uma relação médico-paciente, um diagnóstico correto, se o médico não compreende o paciente e vice-versa?
Sim, essa dificuldade já existe no Brasil mesmo com médicos e pacientes falando português, mas ela só tende a piorar com o "portunhol" que se vislumbra pela frente.
O ministro Padilha já disse que isso não será problema, que é mais fácil treinar um médico em português do que ficar esperando sete ou oito anos até um médico brasileiro ser formado.
Experiências internacionais, porém, mostram que não é tão fácil assim. Na Alemanha, mesmo com a exigência da proficiência na língua, um estudo constatou atraso de diagnósticos pelo fato de o médico estrangeiro não conseguir entender direito os sintomas de pacientes.
Além disso, há queixa dos profissionais alemães, que se sentem sobrecarregados por terem de atuar como intérpretes dos colegas de fora.
Nada contra a vinda dos estrangeiros, desde que estejam aptos para o trabalho. Tenho dúvidas, porém, se três semanas de treinamento, como aventou Padilha, é tempo suficiente para isso.