O Brasil acordou para o fato de que não pode falar sozinho quando se trata da Amazônia. Demorou para entender o óbvio. Mas, ainda a tempo, o governo de Lula da Silva pôs a sua diplomacia a mover-se entre os países vizinhos cobertos pela mesma floresta tropical com a missão de alinhavar posições comuns sobre o combate ao desmatamento e a promoção do desenvolvimento sustentável. A tarefa, a bem da realidade, desdobra-se também na coleta de necessário respaldo para Lula apresentar-se, nas discussões internacionais sobre meio ambiente e mudança climática, como o líder da região.
Espera-se, no Palácio do Planalto, que esse esforço seja consolidado durante a Cúpula da Amazônia, encontro dos líderes de oito países que começa hoje em Belém, no Pará. Trata-se de um movimento diplomático acertado, pragmático em seu objetivo e coerente com o interesse e as possibilidades do Brasil. Nada lembra as despropositadas pretensões de Lula da Silva de intermediar a paz entre Rússia e Ucrânia, ainda viva neste mandato, e de envolver-se em negociação nuclear com o Irã e a Turquia, em sua segunda gestão.
A iniciativa de forjar um bloco amazônico responde à situação de enorme pressão mundial em favor da proteção da Amazônia, em especial quando se discute a evolução do desmatamento vis-à-vis o aquecimento global, enquanto os países da região defrontamse com minguados recursos para tocar a agenda ambiental. Da mesma forma, dá margem a uma confrontação mais encorpada das medidas internacionais que atentam contra o desenvolvimento sustentável da floresta. A mais visível foi posta em prática recentemente pela União Europeia ao penalizar, sob pretexto ambiental, o ingresso de bens produzidos em áreas de florestas tropicais.
Há expectativa do Itamaraty de que o bloco amazônico amadureça suas posições ao longo do tempo e possa apresentar-se, sob a liderança brasileira, como voz única nas futuras negociações da Conferência das Nações Unidas para a Mudança do Clima (COP). Não se vislumbra, porém, o teste desse formato ainda neste ano, durante a COP-28 de Dubai. O presidente Lula certamente estará imbuído, nos Emirados Árabes, da missão preliminar de restaurar o protagonismo do Brasil nas discussões sobre mudança climática – atributo destruído junto com parcelas da Amazônia Legal pelo nefasto desmonte da proteção ambiental na gestão de seu antecessor, Jair Bolsonaro.
Daqui a dois anos, na COP-30 de Belém, o bloco amazônico poderá encarnar o papel do anfitrião se vier a exibir uma prestação de contas positiva dos dois anos de cooperação. Há dúvidas, porém. O documento final da reunião de cúpula desta semana estará centrado no combate ao desmatamento, a começar pelo provocado pelo crime organizado que circula livremente na região. Não trará, no entanto, um compromisso único sobre quando zerar a destruição da floresta. Essa aparente falta de ambição é justificável, e o bloco já se conformou com ela. Ao contrário do Brasil, que voluntariamente se comprometeu no Acordo de Paris a alcançar esse objetivo em 2030, outros países amazônicos jamais se arriscaram a pôr uma data por falta de fontes de recursos para programas ambientais.
O bloco amazônico certamente terá de conviver com os tostões escassos para as políticas comuns a serem definidas nesta semana. As reiteradas cobranças de Lula pelos US$ 100 bilhões prometidos pelas economias avançadas aos projetos de transição energética e de preservação florestal de países em desenvolvimento continuam no ar, sem desembolsos efetivos. Não há razão, até o momento, para crer na boa vontade dos países ricos em curto prazo. O bloco terá de fazer sua própria engenharia financeira.
A convocação de uma Cúpula da Amazônia, em si, não chega a ser admirável. A definição de uma pauta comum centrada no combate ao desmatamento ilegal e no desenvolvimento sustentável na Amazônia é o que torna esse evento diplomático apropriado quando a região se vê mundialmente cobrada a manter a floresta em pé. É seu papel no combate ao aquecimento global