Salve o prazer, salve-se quem puder, porque o calendário avisa que esta segunda (31) é o Dia Internacional do Orgasmo e, educadamente, fingiremos todos que ontem, que anteontem, foi dia de outra coisa qualquer.
Salve ele, o orgasmo da espécie que for, se múltiplo, se solitário, se acompanhado da gritaria de “ai, meu Deus!” ou de centenas de fogos de artifício explodindo na cabeça de seu usufrutuário. Salve a quem se ajoelha a Senhor tão poderoso e cada vez mais abertamente reconhecido por suas benesses. Salve a apresentadora Angélica, que acabou de presentear a mãe com um vibrador igual ao seu, de ultimíssima geração.
Um governo de esquerda deveria ter uma política voltada para a geração de orgasmos e tirar 30% das mulheres brasileiras da miséria de, segundo pesquisa recente, jamais ter tido um. Gozar é capítulo primeiro da constituição que interessa, um item fundamental da cesta básica que põe o país de pé. Semana passada, o anúncio da retomada das aulas de educação sexual soou como medida razoável para se chegar a uma nação mais equilibrada e feliz — mas, calma, isso é apenas uma preliminar.
Todo poder emana da alegria do orgasmo e é bom que ele esteja entrando na pauta do jornal não mais como uma dificuldade, um Shangrilá distante aonde talvez nunca se chegue. Virou uma conquista, uma caixinha de surpresas a ser apreciada sem moderação e com bom humor. Recentemente, deu aqui no GLOBO, pesquisadores da Universidade Charles, em Praga, na República Tcheca, identificaram três tipos de orgasmo feminino, que graciosamente rotularam de “onda”, “avalanche” e “vulcão”.
Hoje, em comemoração à data magna de uma existência plena, tenha o seu do tipo que lhe aprouver o desejo e as circunstâncias. Pimenta ao gosto. Depois — se o desfalecimento dos sentidos ainda permitir alguma gota de memória, na resenha sublime de um pillow-talk em conchinha — rotule aquele que pareceu ter sido o seu. Cuidado. Uma vez Woody Allen comentou que finalmente tivera um na noite anterior, mas o analista garantiu que tinha sido do tipo errado.
Todo tipo de orgasmo vale a pena, e tanto é digno de parabéns os orgânicos, aqueles alcançados apenas com os dotes fornecidos pelo Criador, como os da nova saliência artificial, onde se destacam a avassaladora intensidade do sugador feminino e a maciez do Egg, um artefato masculino. Só não saia da cama sem o seu. Descarte o do tipo Meg Ryan, aquele em que, numa mesa de lanchonete, ela começa a gemer incongruências, a resfolegar sustenidos, a ter um formigamento escalando os poros, até finalmente soltar um “oh god!” de alívio. Foi em “Harry e Sally”. Era do tipo falso.
O orgasmo de verdade saiu do armário e cada um corre com as armas que possui atrás desse direito inalienável do cidadão, como anuncia com transparência moderna, no enfrentamento dos rigores da menopausa, a sempre discreta Angélica. Sem mais dessa coisa antiga de fingir estar sendo arrebatado pelo farfalhar de uma constelação de borboletas, pelo alvoroço da banda do Corpo de Bombeiros tocando “Satisfaction”, ou tudo mais que deveras não se sente. Ele é pop, tá na Globo, e é bom que assim seja, às claras, na real, porque saúde é coisa séria — e orgasmo, então, nem se fala.