Essência ou existência? Disposição ou situação? O homem ou o cargo? As três perguntas são a mesma, apresentadas nas dimensões filosófica, psicológica e política. Dando mais concretude à questão, uma função elevada eleva o indivíduo que a exerce ou são as características da pessoa que prevalecem, independentemente do cargo que ocupe?
Até alguns anos atrás, eu não hesitaria muito antes de responder que a cadeira faz o homem. Não faltam, afinal, exemplos de políticos medíocres e mesmo ruins que, por estar na posição certa na hora certa, acabaram agindo como verdadeiros líderes.
Um exemplo gritante é o de Rudolph Giuliani. Hoje, abraçado a Trump, ele não para de afundar a própria imagem, não apenas como político mas também como ser humano. Na esteira dos ataques de 11 de setembro de 2001, contudo, por ocupar o posto de prefeito de Nova York e ter sabido se comportar diante das câmeras, Giuliani se consagrou como herói. Experimentou enorme popularidade, recebeu honrarias em todo o mundo e foi eleito homem do ano pela revista Time.
O que me fez balançar em relação à ideia de que o cargo prepondera foi a eleição de figuras como Donald Trump e Jair Bolsonaro para altas funções. A tal da posição elevada em nada elevou suas atitudes. Ao contrário, aumentou o poder destrutivo de suas personalidades.
Não me parece absurdo concluir que, quando a essência é horrível demais, não há cargo que dê jeito. Mas essa não é a única interpretação. Também podemos considerar que, na era afeita a populismos em que vivemos, esses indivíduos só chegaram a seus postos porque diziam as barbaridades que diziam, e o povo, tomando maldade por autenticidade, os elegeu. Essa hermenêutica não muda nada em termos de resultados, mas nos libera para seguir acreditando que é o cargo que dá as cartas, e nosso problema está no cargo de eleitor. Como dizia Sartre, a existência precede a essência.