A criminalidade cresce a cada dia e parece fugir do controle dos
órgãos encarregados de detê-la
Estar, hoje, a mais alta corte de Justiça do país, julgando um processo que
envolve algumas importantes figuras do mundo político nacional é um fato de
enorme significação para o país.
É verdade que esse processo estava há sete anos esperando julgamento e que
muitas tentativas foram feitas para inviabilizá-lo. Até o último momento, no dia
mesmo em que teve início o julgamento, tentou-se uma manobra que o suspenderia,
desmembrando-o em dezenas de processos sujeitos a recursos e protelações que
inviabilizariam qualquer punição dos réus.
Mas a proposta foi rechaçada e, assim, o julgamento prossegue. Se os culpados
serão efetivamente punidos, não se pode garantir, uma vez que os mais famosos e
sagazes advogados do país foram contratados para defendê-los. Além disso, como
se sabe, punição, no Brasil, é coisa rara, especialmente quando se trata de
gente importante.
E é sobre isso que gostaria de falar, porque, como é do conhecimento geral,
poucos são os criminosos condenados e, quando o são, nem sempre a pena
corresponde à gravidade do crime cometido. Sei que estou generalizando, mas sei
também que, ao fazê-lo, expresso o sentimento de grande parte da sociedade, que
se sente acuada, assustada e, de modo geral, não confia na Justiça. Nem na
polícia.
Agora mesmo, uma pesquisa feita pelo Datafolha deixou isso evidente.
Embora 73% dos entrevistados achem que os réus do mensalão devem ser condenados,
apenas 11% acreditam que eles sejam mandados para a cadeia.
E é natural que pensem assim, uma vez que a criminalidade cresce a cada dia e
parece fugir do controle dos órgãos encarregados de detê-la e combatê-la.
Outro dia, um delegado de polícia veio a público manifestar sua revolta em
face das decisões judiciais que mandam soltar criminosos, poucas horas depois de
terem sido presos em flagrante, assaltando residências e ameaçando a vida dos
cidadãos. Parece que uma boa parte dos juízes pensa como um deles que,
interpelado por tratar criminosos com benevolência, respondeu que "a sociedade
não tem que se vingar dos acusados".
Entendo o delegado. Mas pior que alguns juízes é a própria lei. Inventaram
que marmanjos de 16, 17 anos de idade, que assaltam e matam, não sabem o que
fazem. Lembro-me de um deles que, após praticar seu oitavo homicídio, ouviu de
um repórter: "Ano que vem você completa 18 anos, vai deixar de ser de menor". E
ele respondeu: "Pois é, tenho que aproveitar o tempo que me resta".
Todo mundo sabe que os chefes de gangues usam menores para eliminar seus
rivais. São internados em casas de recuperação que não recuperam ninguém e donde
fogem ou recebem permissão para se ressocializar junto à família. Saem e não
voltam. Meses, anos depois, são presos de novo porque assaltaram ou mataram
alguém. E começa tudo de novo.
Mas isso não vale só para os menores de idade. Criminosos adultos,
reincidentes no crime, condenados que sejam, logo desfrutam do direito à prisão
semiaberta, que lhes permite só dormir no presídio.
Há algumas semanas, descobriu-se que dezenas desses presos, da penitenciária
de Bangu, no Rio, traziam drogas para vender na penitenciária. E tudo articulado
com o uso de telefones celulares, de que dispõem à vontade, inclusive para
chantagear cidadãos forjando falsos sequestros. Com frequência, ao prender
assaltantes, a polícia constata que se trata de criminosos que cumpriam pena e
que, graças ao direito de visitar a família no Dia das Mães, das tias ou das
avós, saem e retornam, não à prisão, mas à prática do crime.
Esses fatos se repetem a cada dia, com o conhecimento de todo mundo,
especialmente dos responsáveis pela aplicação da Justiça, mas nada é feito para
evitá-los ou sequer reduzi-los.
A impressão que se tem é que tomou conta do sistema judiciário uma visão
equivocada, segundo a qual o crime é provocado pela desigualdade social e, sendo
assim, o criminoso, em vez de culpado, é vítima. Puni-lo seria cometer uma dupla
injustiça.
O que essa teoria não explica é por que, havendo no Brasil cerca de 50
milhões de pobres, não há sequer 1 milhão de bandidos. Isso sem falar naqueles
que de pobres não têm nada, moram em mansões de luxo e mandam no país.
Da Folha