Deputado federal Josimar Maranhãozinho (PR - MA) Foto: Gilmar Felix / Câmara dos Deputados
BRASÍLIA — No dia 24 de junho
de 2020, o deputado federal Josimar Maranhãozinho (PL-MA) se encontrou em
Brasília com o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra), Geraldo Melo Filho. A reunião foi registrada em uma foto postada
nas redes sociais do parlamentar, que comemorou a “celebração de convênios que
beneficiarão municípios maranhenses”. Dois meses depois, em agosto,
Maranhãozinho revelou em uma “live” qual cidade do seu estado seria agraciada:
Zé Doca, comandada por sua irmã, a prefeita Josinha Cunha (PL).
— Porque nós temos parceria com
o governo federal, e aí vocês podem comprovar. Se formos falar de asfalto
(....) vocês vão ver os inúmeros empenhos feitos para Zé Doca. Ano passado, nós
empenhamos mais de R$ 40 milhões para os cofres públicos de Zé Doca — afirmou o
deputado, empolgado com os repasses destinados à cidade de 50 mil habitantes,
localizada a 312 quilômetros da capital, São Luís.
Graças à parceria com o governo
federal, anunciada por Maraonhãozinho, Zé Doca conseguiu receber dinheiro para
obras de pavimentação. Os recursos foram liberados por meio de um convênio do
Ministério da Agricultura, ao qual o Incra está subordinado. O acordo foi
assinado no fim de 2018, mas só foi destravado quase dois anos depois. Entre
agosto de 2020 e março de 2021, a pasta realizou três transferências ao
município no valor total de R$ 1,8 milhão.
Contratada para realizar a
obra, a PRL Pereira chamou a atenção das autoridades. Segundo a
Controladoria-Geral da União (CGU), a empresa “nunca possuiu empregados nem
veículos e adquiriu insumos em quantidade pouco significativas em face às obras
que deveria ter realizado”. Além disso, o dono da firma é um jovem de 26 anos
que declarou renda de R$ 2,91 mil em 2018 e se inscreveu como pretendente do
Auxílio Brasil (à época, Bolsa Família), programa social do governo voltado à
população carente.
Após receber uma denúncia, a
Polícia Federal instaurou um inquérito que tramita em sigilo no Supremo
Tribunal Federal (STF) para apurar o caso. Ao analisarem as provas, os
investigadores encontraram indícios de que o deputado usa o mandato para
“influir na liberação de recursos que venham abastecer o pagamento de obra
pública não executada em convênio realizado com prefeitura chefiada por
familiar, operação esta que se revela meio intermediário para o desvio de
recursos públicos”.
Com base num relatório de
inteligência financeira do Coaf, órgão de combate à lavagem de dinheiro, a PF
rastreou uma transação entre a PRL e duas empresas que têm ligações com
Maranhãozinho — a Construtora Madry e a Joas Consultoria. A primeira, segundo
os investigadores, pertence ao deputado. A segunda, conforme o inquérito, tinha
a irmã dele como sócia até 2015 e agora é administrada por duas assessoras
parlamentares da Assembleia Legislativa do Maranhão.
Segundo a PF, a Joas recebeu um total de R$ 368 mil da PRL Pereira entre agosto de 2019 e novembro de 2020. E a Madry, R$ 164 mil, entre agosto de 2019 e agosto de 2020. Os repasses, segundo a PF, coincidem com os primeiros pagamentos do Ministério da Agricultura ao convênio alvo da investigação.
Deputado nega
Por meio de sua assessoria, Maranhãozinho nega as
acusações. Diz que o convênio com o ministério foi assinado quando ele era
deputado estadual e afirma que “as negociações entre construtoras são de natureza
inteiramente privada”. Sustenta ainda que “a obra referida está pronta e
aprovada pelos órgãos fiscalizadores”.
Dirigente estadual do PL, partido do presidente
Jair Bolsonaro, Maranhãozinho ganhou projeção após ser investigado pela PF em
outro inquérito, no qual foi flagrado carregando uma caixa com dinheiro em seu
escritório político. Os recursos em espécie, segundo a PF, eram fruto de um
esquema de desvio de verba parlamentar. A Procuradoria-Geral da República
avalia, desde dezembro, se apresentará denúncia contra o deputado,
pré-candidato a governador.
Em nota, o Ministério da Agricultura
afirmou que o contrato de repasse foi assinado em 2018 com a Caixa Econômica
Federal, “responsável pelo acompanhamento da execução da obra”, dentro de um
programa de “Fomento ao Setor Agropecuário” do Orçamento Geral da União. A
pasta ainda informou que não foi avisada da investigação pela PF, mas que “está
pronta para colaborar”, caso seja acionada.
O Incra frisou que não “teve participação” no contrato alvo de
investigação. Por meio de sua assessoria, Geraldo Melo Filho confirmou que
recebeu Maranhãozinho para tratar de convênios e assentamentos, mas alegou que,
após o encontro, não firmou nenhuma nova parceria com municípios maranhenses.
Procurada, a prefeita de Zé Doca não quis se pronunciar. O dono da empresa PRL
Pereira não foi localizado.