VALOR ECONÔMICO - 10/08
Qualquer pessoa que acompanhe a campanha presidencial americana precisa compreender que as pesquisas de opinião nacionais não proporcionam uma visão precisa do desfecho eleitoral. Graças ao Colégio Eleitoral americano, não é o destinatário da maioria dos votos no país como um todo que importa, no fim das contas, mas quem vence em quais Estados.
A cada Estado é atribuído um
determinado número de votos no Colégio Eleitoral, dependendo do tamanho de sua
população. O candidato que cruza o limiar de 270 votos eleitorais ganha a
Presidência.
Em quase todos os Estados, um candidato que ganha 50,1% do voto popular leva 100% de seus votos eleitorais (só Maine e Nebraska não seguem a regra pela qual o vencedor leva tudo; eles dividem o voto do Colégio Eleitoral por distrito congressional). Em consequência, os votos de milhões de pessoas que participam da eleição acabam não contando. Se você é um republicano em Nova York ou na Califórnia, que são dominados pelos democratas, ou um democrata em Wyoming ou Mississippi, que são confiavelmente republicanos, esqueça - seu voto para presidente não vai contar.
O sistema tem enorme impacto na campanha, já que determina onde os candidatos gastam seu tempo e dinheiro. Apenas cerca de dez Estados são tidos como "decisivos", capazes de preferir qualquer dos dois partidos; os demais são "seguros" para um ou outro partido.
Um resultado peculiar desse sistema peculiar é que um candidato pode obter a maioria do voto popular nacional, mas perder no Colégio Eleitoral, se for derrotado por pouco em Estados populosos e ganhar em alguns Estados menores. Isso não ocorre frequentemente, mas sempre que acontece, os EUA passam por um paroxismo desesperado diante desse mecanismo aparentemente antidemocrático. No caso mais recente, Al Gore ganhou a maioria do voto popular em 2000, mas George W. Bush conquistou a Presidência.
Devido ao Colégio Eleitoral, os eleitores vão às urnas não para votar num candidato, mas em um elenco de eleitores - militantes do partido, inclusive amigos e aliados do candidato - que irão defender sua escolha. O papel dos eleitores é uma breve formalidade; eles se reúnem em seu Capitólio estadual e votam. Mas já sabemos qual será o desfecho disso, porque os resultados das eleições presidenciais são reportados nesse momento em termos de quem conquistou cada Estado.
Nesse ponto, a contagem de votos nacional é insignificante. O Congresso se reúne e "conta" os votos eleitorais; mas isso também é mera formalidade. (A disputa Bush-Gore foi incomum, pois um vencedor só foi definido em 12 de dezembro, mais de um mês após a eleição, quando aSuprema Corte, numa decisão partidária e extremamente controvertida, votou por 5 a 4 pelo fim da recontagem dos votos na Flórida, entregando a presidência a Bush).
Então, aqui é onde as coisas podem ficar complicadas, e surgem possibilidades para malandragens: se ninguém obtém 270 votos no Colégio Eleitoral, a eleição vai para a Câmara, onde cada delegação estadual tem um único voto, independentemente do número de eleitores que a delegação representa. Wyoming (população de 585 mil) e Califórnia (população de 39 milhões) representam um único voto. E as delegações não são obrigadas a votar no candidato que obteve a maioria dos votos em seu Estado.
Então, depois de a Câmara eleger o presidente, o Senado escolhe o vice-presidente - cada senador tem um voto. É teoricamente possível que o Congresso eleja um presidente e um vice-presidente de partidos diferentes.
Esse sistema labiríntico para escolha do presidente reflete a ambivalência dos fundadores dos Estados Unidos sobre a democracia popular. Eles não confiavam nas decisões da plebe - nas massas - baseadas em desinformação ou falta de compreensão das questões em jogo. O voto no Reino Unido, em junho, decidindo abandonar a União Europeia - contra o conselho de especialistas e de aliados - parece validar essa preocupação.
Desde o início, os fundadores dos EUA tinham ciência dos perigos de governar por plebiscitos. Alexander Hamilton preocupava-se com dar poder ao povo, porque "eles raramente julgam ou decidem corretamente". Temendo "um excesso de democracia", eles interpuseram salvaguardas institucionais entre as decisões governamentais e as populares. Até 1913, os senadores eram escolhidos pelos legislativos estaduais, e não diretamente escolhidos pelos eleitores. E eles nos deram o Colégio Eleitoral.
Esse sistema tem um enorme impacto sobre a campanha real para a Presidência, uma vez que determina onde os candidatos gastam seu tempo e dinheiro. Apenas cerca de dez Estados são considerados "decisivos", capazes de preferir qualquer dos dois partidos; o demais são considerados Estados "seguros" para um ou outro partido.
Claro que, às vezes, as "certezas políticas" podem errar e um Estado sai fora de sua categoria. Mas esses dez Estados onde são travadas as batalhas são os únicos a serem observados, em busca de pistas sobre o desfecho da eleição. Eles são muito mais indicativos do resultado final do que as pesquisas nacionais.
Por exemplo, Califórnia e Nova York são tão rotineiramente democratas que a única razão pela qual os candidatos lá comparecem é para arrecadar dinheiro. Em contraste, Ohio - a joia da coroa de Estados decisivos, porque segundo a tradição nenhum republicano consegue chegar à Presidência sem vencer lá - é exaustivamente percorrida pelos candidatos. Os outros Estados considerados mais importantes para a vitória para qualquer dos campos são a Flórida e a Pensilvânia.
Como esses Estados populosos,
juntamente com um punhado de outros, rotineiramente escolhem os democratas, os
democratas têm uma vantagem embutida no Colégio Eleitoral. Por essa razão,
acredita-se amplamente que Donald Trump tenha opções mais limitadas para
conquistar 270 votos.
Talvez o Colégio Eleitoral não seja uma ideia tão estranha assim, no fim das contas.
(Tradução de Sergio Blum).
Elisabeth Drew colabora regularmente
com "The New York Review of Books"