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quarta-feira, 21 de novembro de 2012

São Luís por sua iconografia - JOMAR MORAES

Comparado ao de outras capitais brasileiras, o acervo iconográfico relativo a São Luís é pequeno, embora a afirmação mereça reservas, levando-se em conta o fato de ainda não se achar tal acervo conhecido em sua totalidade ou pelo menos em proporção inequivocamente representativa de seu universo.
    Algumas coleções particulares e outras sob custódia de órgãos públicos poderiam compor um conjunto expressivo de imagens da cidade, inobstante subsista a certeza de que muito ainda poderá ser acrescentado, como resultado de pacientes pesquisas. Sim, porque desde há muito fotografa-se em São Luís. Descobertas a arte e a técnica da fotografia, não tardaram os oficiais desses ofícios a aportar na capital maranhense.
    No século XIX, de fins da década de 40 em diante, são cada vez mais comuns os anúncios, pela imprensa, de fotógrafos aqui desembarcados e que ofereciam seus serviços à população. O interesse, por então, não era retratar a cidade, mas as pessoas nela residentes. Antes, entretanto, do surgimento de engenhos mecânicos de reprodução de imagem, os dotados de atributos artísticos para produzi-las ou reproduzi-las fixaram-nas relativamente a São Luís e seus habitantes.
    A imagem inaugural desse rarefeito, porém importante círculo iconográfico é a gravura de L. Gualtier, representativa da solene fundação de São Luís, como sede da França Equinocial, em 8 de setembro de 1612, seguida das seis gravuras que retratam os índios que acompanharam frei Claude d'Abbeville reproduzidas em sua História da missão dos padres capuchinhos na Ilha do Maranhão e terras circunvizinhas; em que se trata das singularidades e dos costumes estranhos dos índio habitantes do país (Paris; Imprimerie de François Huby, 1614; 2ª ed., mesmo ano e mesmo e editor).
    Não são de pessoas nem de paisagens, mas de animais e de vegetais as 160 pranchas litográficas reunidas no livro História de animais e árvores do Maranhão (Lisboa: Arquivo Histórico Ultramarino e Centro de Estudos Históricos Ultramarinos, 1967; 2ª ed., Rio de Janeiro: Alhambra, 1985; 3ª ed., São Luís: Alumar, 1998; 4ª ed., Lisboa: Instituto de Investigação Científica/ Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2000),que corre sob o nome de frei Cristóvão de Lisboa e perfaz 276 desenhos da flora e fauna (inclusive a ictiológica) do Maranhão e do Pará, vasta região que à época estava administrativamente subordinada ao Maranhão. O dizer-se que a História dos animais e árvores do Maranhão corre sob o nome de frei Cristóvão decorre das procedentes suspeitas de que não seja somente ele o autor desse livro, em que subsistem claros indícios de participação francesa na confecção dos desenhos, e isso talvez em razão de iniciativa preexistente ao envolvimento do frade nesse famoso trabalho.
    Da época da invasão holandesa do Maranhão (1641/43) data o desenho do artista plástico batavo Frans Post (1612-80) retratando a nascente cidadezinha de São Luís vista do mar, encimado pela legenda MARAGNON e inserta na "História dos feitos recentemente praticados durante oito anos no Brasil", de Gaspar Barlaeus (Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 1980; tradução de Claudio Brandão).
    Datam do primeiro quartel do século XIX (anos 20) as quatro graciosas aquarelas retratando a vida dos escravos em São Luís, de Joaquim Cândido Guilhobel, cognominado o Debret maranhense. Guilhobel foi um oficial desenhista do Exército português que acompanhou coronel-engenheiro Antonio Bernardino Pereira do Lago em sua missão ao Maranhão, oportunidade em que ambos realizaram obras de saneamento e urbanização de São Luís, além de outros trabalhos de grande importância.
    Também retrata São Luís, porém em outra fase de seu desenvolvimento, pois que 1864, a litografia de T. H. Muller e Gluck, de que existe exemplar no Palácio dos Leões. Diversos anos se passaram até que fosse impresso o primeiro álbum iconográfico de São Luís, o Maranhão Ilustrado(São Luís, Typ. Teixeira, 1899), reunindo 27 fotografias seguidas de textos a elas referentes.
    Logo a seguir (ca. 1904), o mesmo grupo empresarial, porém já sob o nome de Gaspar Teixeira & Irmãos, Sucs., imprimiu o Álbum do Maranhão, conjunto de 24 fotos apenas legendadas, mas com este curioso detalhe: todas foram manualmente coloridas. Tal fato inicia um importante capítulo da história cartão-postal no Maranhão, onde desde há muito circulava esse importante instrumento de comunicação interpessoal e de fixação de imagens essenciais para reconstituições históricas e para gratificantes viagens no tempo.
    Mas o que se deseja acentuar é que aí começa ou, mais provavelmente, intensifica-se a produção de cartões-postais. Nem sempre impressos em São Luís, porém produzidos a partir de imagens da capital maranhense, o que lhe deu o veículo adequado para correr mundo. Pelo menos 18 das 24 fotografias insertas no Álbum do Maranhão foram transformadas em cartões-postais.
    Embora César Augusto Marques demonstre diligência e perspicácia em acolher tudo quanto oferecesse interesse para a história do Maranhão em seu clássico "Dicionário histórico-geográfico da província do Maranhão" (1ª ed., 1870; 2ª ed., 1970; 3ª ed., revista e ampliada, 2008) nada fez constar dessa importante obra que se referisse à fotografia no Maranhão, e isso a despeito de tal técnica já haver surgido quando da elaboração do referido livro. Deve-se, porém, à 3ª edição a inserção de um verbete dedicada ao assunto, embora com as lacunas compreensíveis.
    Essa omissão reduz consideravelmente a disponibilidade de informações confiáveis acerca do aparecimento dos primeiros fotógrafos em São Luís e de como se desenvolveu a profissão em terras maranhenses. Sabe-se, entretanto, que as sucessivas técnicas de reprodução da imagem (que aqui serão genérica e indistintamente chamadas fotografia) não tardaram a chegar ao Maranhão, a partir da comunicação oficial da revolucionária descoberta de Louis Jacques MandéDaguerre, feita em 19 de agosto de 1839, por François Arago, às Academias de Ciências e de Belas-Artes de Paris.
   Sem nenhuma intenção de apontar uma data inicial, refira-se que já em agosto de 1846 o daguerreotipista norte-americano Charles D. Fredericks anunciava, sob a razão social A. & C. D. Fredericks (o A. seria de seu sócio e acompanhante Alexander B. Weeks, que logo se desligaria da firma, tornada individual), sua recente chegada a São Luís, procedente de Belém, dispondo-se a fazer retratos coloridos pelo processo daguerreotipia. Em janeiro do ano seguinte, dizia Fredericks pela imprensa que acabara de receber de Nova York "um belo sortimento das mais perfeitas lâminas (ou chapas)", razão por que resolvera "demorar-se mais alguns dias nesta cidade para que possam com oportunidade obter os progressos da presente ocasião todos aqueles que ainda não o tenham feito."