Jair Bolsonaro foi um militar indisciplinado, durante anos visto dessa forma pela maioria do alto escalão do Exército, sua Força de origem.
Em meio à sua surpreendente ascensão como presidenciável, cercou-se de generais da reserva, que estabeleceram pontes com o comando ativo. Virtual eleito, a aliança já estava selada.
A resultante foi um governo com número inédito de ministros vindos da caserna —8 de 22. O primeiro ano de mandato transcorreu com numerosos entrechoques entre esta ala e a dita facção ideológica do bolsonarismo, associada aos filhos do presidente e ao escritor Olavo de Carvalho.
Aos poucos, militares que pareciam servir de contrapeso a uma gestão turbulenta se tornaram parte da confusão, retraindo-se. Alguns perderam o cargo, dos quais o mais vistoso foi o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, que ocupava a Secretaria de Governo.
Para a vaga foi outro general, Luiz Eduardo Ramos, muito próximo de Bolsonaro. Viu crescer sua influência, enquanto fardados eram chamados para tratar de temas como os incêndios na Amazônia.
A nomeação do general Walter Braga Netto para a Casa Civil coroa essa reabilitação. Ela serve para fortalecer o núcleo do governo, e ao mesmo tempo gera incerteza sobre a capacidade de articulação política do Palácio do Planalto.
Para lá também irá um almirante, Flávio Rocha, que na Secretaria de Assuntos Estratégicos retirará poderes de um dos expoentes do bolsonarismo mais radical, o assessor Filipe Martins.
“Ficou completamente militarizado o meu terceiro andar”, gabou-se o presidente, citando a área do Planalto em que despacham os titulares da Casa Civil, da Secretaria de Governo e do Gabinete de Segurança Institucional, todos generais.
Se não há óbice legal à presença de egressos das Forças Armadas em cargos públicos civis, algo aliás defensável em funções afins às suas qualificações, tal movimento, nessas proporções, não deixa de ser temerário.
Ramos, Braga Netto, Rocha e outro almirante, Bento Albuquerque, titular da pasta de Minas e Energia, são oficiais da ativa e de quatro estrelas, o topo da carreira. O chefe da Casa Civil vem do segundo posto na hierarquia do Exército.
O risco colocado, ao longo do tempo, é o de que a militarização da política enseje a politização dos militares, algo de sombria lembrança num país dado a golpes e quarteladas.
Mesmo que a situação seja provisória, com a ida futura de todos à reserva, o precedente está aberto. Por ora, a presença exagerada das Forças na administração Bolsonaro já resulta em privilégios para as carreiras e investimentos militares.