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domingo, 5 de janeiro de 2020

A 'nova' ABI e a democracia

A eleição de Jair Bolsonaro abriu um período no qual a democracia passou a correr perigo. Não há, na afirmação, um exagero. Ela se sustenta em atos e declarações do presidente ao longo de sua vida pública. São notórias as demonstrações de apreço de Bolsonaro à ditadura militar.
Esse pano de fundo levou um conjunto de jornalistas a se organizar, no começo de 2019, para trazer de volta ao cenário a Associação Brasileira de Imprensa, a velha ABI. Criada há 111 anos e protagonista nas mais importantes lutas do povo brasileiro, a entidade estava abandonada à própria sorte e alheia à realidade nacional. Mas, no governo Bolsonaro, passou a ser tarefa urgente trazê-la de volta às lutas em defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade de imprensa.
Não foi fácil a retomada. A antiga diretoria usou diversos artifícios para se agarrar ao poder. Adiou o quanto pôde a eleição. Até mesmo a lista dos associados —necessária para que a oposição fizesse campanha eleitoral— só foi obtida por ordem judicial. Um pleito que deveria ter acontecido em abril só teve lugar em junho. Mas, por larga margem, deu uma esmagadora vitória à oposição, cuja chapa não por acaso intitulava-se “ABI: Luta pela democracia”.
A nova diretoria encontrou a entidade às traças. O CNPJ estava suspenso, e as contas bancárias, bloqueadas. Aos poucos, a casa vai sendo arrumada. E, embora o título deste artigo fale em “nova” ABI, o que nos inspira é o retorno à “velha” ABI.
Nesses poucos meses transcorridos desde a nossa posse, ela já retomou seu papel na defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade de imprensa. Já no fim de julho de 2019, realizamos um gigantesco ato em defesa do jornalista Glenn Greenwald, ameaçado de expulsão do país por um decreto de Bolsonaro e de seu ministro Sergio Moro (Justiça). Acorreram ao evento mais de 4.000 pessoas. O auditório da ABI, um dos maiores do Rio, mostrou-se pequeno ante tanta gente. Foi necessário instalar telões na rua para transmitir o ato. Nunca na história da centenária ABI tinham acorrido tantas pessoas a um evento.
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Ato de apoio ao jornalista Glenn Greenwald na ABI (Associação Brasileira de Imprensa), no Rio de Janeiro - Lucas Rezende - 30.jul.19/Futura Press/Folhapress
Mais recentemente, em 12 de dezembro, ao lado de outras entidades, organizamos um ato em defesa da Petrobras, sob risco de privatização. Desenvolvemos também a campanha “Toda vida importa muito”, de combate à criminosa “política de segurança” do governador Wilson Witzel (PSC), a qual levou a polícia do Rio, de janeiro a agosto, a matar em média mais de cinco pessoas por dia —pobres e residentes em comunidades carentes ou favelas.
Quando Bolsonaro ordenou que os órgãos do governo federal cancelassem as assinaturas desta Folha, a ABI imediatamente ingressou na Justiça com uma ação popular contra o ato, denunciando-o como um atentado contra o princípio constitucional da liberdade de imprensa. No dia seguinte, Bolsonaro recuou e cancelou a ordem.
Quando o prefeito Marcelo Crivella (PRB) proibiu, recentemente, a presença das equipes jornalísticas do Grupo Globo em entrevistas coletivas da Prefeitura do Rio de Janeiro, prontamente emitimos nota oficial denunciando o ato como outra agressão à liberdade de imprensa.
Enfim, esta não é a “nova” ABI, mas a volta da velha ABI, aquela de Barbosa Lima Sobrinho, que sempre esteve à frente das melhores causas ao longo de nossa história.
Paulo Jeronimo de Sousa
Jornalista, é presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)