O homem que circula na Câmara com uma Bíblia erguida no ar é o deputado federal mais votado da Bahia. Não se sabe o que levou 323 mil pessoas a escolherem o Pastor Sargento Isidório (Avante), mas ele achou que a prioridade de seu mandato deveria ser um projeto para classificar o livro sagrado cristão como patrimônio da humanidade.
A ala folclórica da frente evangélica é uma peça de marketing. Por trás de personagens excêntricos, porém, estão grupos que desenvolveram uma atuação unificada para mudar leis e, principalmente, barrar propostas que entrem em choque com princípios conservadores.
A bancada da Bíblia agora pretende testar seu poder sob um presidente que usa o slogan “Deus acima de todos” e que nomeou como ministra uma pastora que faz questão de destacar que é “terrivelmente cristã”.
Na estreia do Congresso, um deputado se aventurou a sugerir a proibição da venda e da distribuição da pílula do dia seguinte e do dispositivo intrauterino conhecido como DIU.
Márcio Labre (PSL) queria igualar o uso de contraceptivos ao aborto e dizia contar “com a proteção de Deus” para a proposta. Seria um retrocesso de décadas na saúde pública. Depois, ele alegou que o texto não estava finalizado e retirou o projeto.
O viés religioso do novo governo dá fôlego a esses grupos. Jair Bolsonaro chegou ao Planalto com respaldo em massa de eleitores evangélicos. Ele precisará fazer algumas entregas para agradá-los.
O avanço dessas pautas enfrentará algumas resistências internas. Ministros de Bolsonaro já disseram que a agenda conservadora ficará em segundo plano e que a prioridade é a reforma da Previdência.
Em entrevista ao jornal O Globo, o vice-presidente Hamilton Mourão chegou a declarar que o aborto deve ser uma decisão da mulher. O deputado Otoni de Paula (PSC), da bancada evangélica, fez um discurso para ameaçá-lo. “Defenda a vida e o Deus do céu te abençoará. Defenda a morte dos inocentes e esse mesmo Deus te arrancará desse lugar!”
Bruno Boghossian