Em uma semana de governo, os ruídos de comunicação envolvendo membros do primeiro e segundo escalões do Executivo federal, bem mais sérios do que normalmente poder-se-ia esperar de uma equipe recém-empossada, parecem ter acendido um tardio sinal de alerta no Palácio do Planalto. No período, o presidente Jair Bolsonaro tomou duas decisões que se prestam a disciplinar a comunicação oficial do governo federal.
A primeira delas está contida no Decreto n.º 9.671, de 2 de janeiro, que, entre outras providências, transfere para a Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) da Secretaria de Governo da Presidência da República a competência para “administrar as contas pessoais do presidente da República” e as “contas institucionais da Presidência da República” nas redes sociais. A segunda é um despacho do presidente, publicado no Diário Oficial da União de 8 de janeiro, determinando à Secretaria de Governo e às entidades a ela vinculadas, incluindo a Secom, “a estrita observância ao disposto no art. 37, caput, e § 1.º da Constituição em todas as comunicações e divulgações relativas às ações do governo federal”.
O referido dispositivo constitucional determina que os atos da administração pública devem ser pautados pelos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade e da eficiência, devendo a publicidade de tais atos, programas, obras, serviços e campanhas de órgãos públicos “ter caráter educativo, informativo ou de orientação social”.
Ambas as decisões do presidente Jair Bolsonaro são bastante oportunas. Mas para que produzam os bons resultados pretendidos, que, ao fim e ao cabo, traduzem os valores republicanos que nossa Lei Maior visa a proteger, irão demandar uma radical mudança de comportamento do próprio presidente da República.
Comecemos pelas redes sociais. A esta altura, já não é novidade a importância que o presidente Jair Bolsonaro dá à comunicação direta com a população por meio de seus perfis no Twitter e no Facebook. As redes, no seu entendimento, foram as grandes responsáveis por sua eleição, no que ele chama de “a campanha mais barata da história”. Eleito, Bolsonaro não apenas decidiu manter a vitoriosa estratégia adotada durante a campanha, como a elevou ao patamar de meio de comunicação oficial de atos de seu governo, “sem mediação”. Os nomes dos ministros, por exemplo, assim que escolhidos eram anunciados pelo então presidente eleito pelo Twitter.
Enquanto candidato, Jair Bolsonaro podia fazer o que bem entendesse de suas redes sociais. Poderia publicar o que lhe desse na veneta e escolher quem poderia ou não ver as mensagens que publicava. Se após sua eleição um órgão de Estado passou a ter a responsabilidade de administrar não só suas contas pessoais, como a conta institucional da Presidência, o que é salutar, melhor será se o presidente reavaliar seu comportamento online.
Manter as postagens com viés publicitário, como se viu no curso da campanha, afronta a Constituição. Tampouco está à altura do cargo que ocupa o presidente Bolsonaro se engajar em bate-bocas com adversários na internet. Mais grave ainda é bloquear o acesso às suas postagens a quem, seja pela razão que for, lhe desagrade. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fez o mesmo, bloqueando jornalistas críticos ao governo, e a Justiça americana o fez voltar atrás, em nome da liberdade de imprensa.
Com o despacho publicado no Diário Oficial, o presidente Jair Bolsonaro pretende que “seus ministros e toda a equipe unifiquem o discurso e adotem uma comunicação clara e harmônica dos atos do governo federal”. Sem dúvida, é medida muitíssimo acertada, desde que valha também para o próprio presidente, ele mesmo fonte de alguns dos mais graves ruídos de comunicação neste início de governo.
Do presidente da República é esperado que tenha a exata noção do papel institucional que representa, tanto no meio dito tradicional como no meio digital. Não há distinção no seu caso.