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segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

O GLOBO - Nabhan terá influência em 6 mil licenciamentos

Esvaziamento da Funai dará ao presidente da UDR poder no processo das licenças ambientais. Secretaria de Assuntos Fundiários, que será liderada por ele, dará pareceres sobre impacto de obras em áreas indígenas

Decisões. Nabhan Garcia vai concentrar parte das autorizações ambientais


O futuro secretário especial de Assuntos Fundiários, o líder ruralista Luiz Nabhan Garcia, poderá influir em mais de 6 mil processos de licenças ambientais, nas mais diferentes esferas e etapas. A secretaria de Nabhan passará a ser a responsável pelos pareceres relacionados ao impacto de obras em terras indígenas, conforme determinado pela equipe de transição.

Esses pareceres fazem parte da rotina para a emissão de licenças pelos órgãos ambientais e hoje estão a cargo da Fundação Nacional do Índio (Funai), que será esvaziada no governo de Jair Bolsonaro. Tramitam pela Coordenação-Geral de Licenciamento Ambiental da Funai mais de 6 mil processos, referentes a licenças nas esferas municipais, estaduais e federal.

Presidente da União Democrática Ruralista (UDR), Nabhan teve papel de destaque na campanha presidencial de Bolsonaro. Depois da eleição, foi anunciado como futuro secretário especial de Assuntos Fundiários, estrutura a ser criada no Ministério da Agricultura.

O Ibama tem hoje 2,8 mil processos de licenciamento em andamento. Menos da metade precisa ser remetida para que a Funai se posicione. O órgão, no entanto, não se limita a avaliar pedidos de licenças federais. A Funai é consultada em procedimentos de licenças municipais e estaduais, o que leva ao universo de mais de 6 mil processos. Até janeiro deste ano, oito servidores eram responsáveis na Funai pelas análises nos processos de licenciamento. Hoje, a equipe tem 30 pessoas.

Um mesmo processo de licenciamento federal pode passar até seis vezes pela Funai. A partir do momento em que o empreendedor preenche a chamada ficha de caracterização de atividade e informa que há uma terra indígena no caminho, o caso é remetido ao órgão. O próprio Ibama também faz cruzamentos com sistemas de georreferenciamento para identificar áreas indígenas potencialmente impactadas por um determinado projeto.

Os pareceres da Funai não são vinculantes, ou seja, o Ibama não tem a obrigação de segui-los. Mas a afinação entre os dois órgãos é uma praxe, como forma de se evitar contestações pelo Ministério Público Federal.

Um caso emblemático que envolve um licenciamento dependente de análise na Funai é o da linha de transmissão de energia entre Manaus e Boa Vista, o linhão de Tucuruí. Dos cerca de 700 quilômetros da linha, 123 quilômetros passam pelo território da etnia Waimiri Atroari. Roraima é o único estado não interligado ao sistema nacional e sofre com apagões frequentes. A Venezuela fornece energia ao estado.

Em agosto, o governo federal decidiu dividir o licenciamento ambiental do linhão, após uma reunião interministerial no Palácio do Planalto. O projeto foi licitado em 2011 e ainda não saiu do papel. A decisão tomada é que um processo cuidaria da licença para o trecho dentro do território indígena e outro, da licença na área fora da demarcação.

O futuro governo quer flexibilizar os processos de licenciamento ambiental, sob o argumento de que atrapalha obras de infraestrutura. Pretende também parar de demarcar novas terras indígenas e permitir atividades econômicas irrestritas — em especial mineração e arrendamentos agropecuários —nesses territórios.