O GLOBO - 12/07
Custo da Justiça no Brasil é recorde. Brasileiros pagam muito por uma burocracia
cuja característica é a lentidão, com 70% de congestionamento nos tribunais
Dias atrás, Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, atravessava o
Dias atrás, Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, atravessava o
restaurante quando ouviu uma voz feminina: — Ô, ministro! Ele parou, sorriu e estendeu a
mão para a mulher na mesa: “Olá, como vai?” Ela respondeu ao gesto: “Parabéns.
A sociedade brasileira congratula Vossa Excelência pelo julgamento do mensalão e
por aumentar os próprios benefícios agora nesse momento social tão importante...”
Lewandowski percebeu a ironia, manteve o sorriso, e seguiu.
A cena está na rede. Tem valor simbólico sobre a percepção coletiva do alto
custo e da baixa eficiência da administração da Justiça, no debate sobre o
tamanho da burocracia que a sociedade pode e/ou deseja sustentar.
O Brasil mantém a Justiça mais cara do planeta, comprovam os pesquisadores Luciano
O Brasil mantém a Justiça mais cara do planeta, comprovam os pesquisadores Luciano
Da Ros, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Matthew M. Taylor, da
American University, que mapeiam as mudanças no sistema judicial a partir da
redemocratização do país.
O Poder Judiciário consome anualmente 1,3% do Produto Interno Bruto, ou 2,7% de tudo que
O Poder Judiciário consome anualmente 1,3% do Produto Interno Bruto, ou 2,7% de tudo que
é gasto pela União, pelos estados e municípios. Significa uma despesa anual de
R$ 306,35 (US$ 91,2) no bolso de cada um dos 200 milhões de habitantes. Esse nível
de gasto com o Judiciário só é encontrado na Suíça, cuja população é 25 vezes menor
e a renda, cinco vezes maior.
O custo brasileiro aumenta quando somado o orçamento do Ministério Público, que
O custo brasileiro aumenta quando somado o orçamento do Ministério Público, que
não dá transparência às suas despesas. Vai a 1,8% do PIB, o equivalente a
R$ 87 bilhões (US$ 26,3 bilhões). Supera o orçamento de metade dos estados.
É o dobro das obras contratadas pelo governo federal, até abril, nas áreas de
Transportes, Saneamento, Habitação e Urbanização.
Caro demais, ressaltam os pesquisadores, para quem o orçamento do Judiciário brasileiro
Caro demais, ressaltam os pesquisadores, para quem o orçamento do Judiciário brasileiro
é o mais alto por habitante no Ocidente. Essas instituições do Brasil custam 11 vezes mais
que as da Espanha; dez vezes mais que na Argentina; nove vezes mais que nos
EUA e Inglaterra; seis vezes mais que na Itália, na Colômbia e no Chile; quatro vezes
mais que em Portugal, Alemanha e Venezuela. Coisa semelhante, só na
Bósnia-Herzegovina e em El Salvador. Cada decisão judicial no Brasil (US$ 681,4) é,
na média, 34% mais cara que na Itália (US$ 508,8).
Da Ros e Taylor continuam tentando entender por que os brasileiros pagam tão caro por
um serviço judiciário cuja característica é a lentidão, onde dois em cada três processos
remancham nos tribunais e alguns demoram mais que uma vida para julgamento.
Pelo ângulo estrito da despesa, verificaram o peso da enorme força de trabalho do
sistema de justiça nacional. São 412.500 funcionários, o equivalente a 205 servidores por
100 mil habitantes — são 25 por cada um dos 16.500 juízes. Proporcionalmente, o Brasil
tem cinco vezes mais funcionários no Judiciário do que a Inglaterra, e quatro vezes acima
do que têm Itália, Colômbia e Chile.
A pesquisa prossegue, com foco no histórico dessa burocracia, cujo custo para a sociedade
A pesquisa prossegue, com foco no histórico dessa burocracia, cujo custo para a sociedade
se multiplica pela ineficiência. Em torno dela gravita uma indústria com 880 mil advogados
registrados (300% mais que na década de 90) e 1.100 faculdades produzindo
anualmente 95 mil novos bacharéis.
Esse número de escolas é cinco vezes maior do que nos EUA, onde se formam 45 mil por ano.