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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Além das urnas - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

     O Congresso retomou as atividades de 2014 de olho nas urnas de outubro. Como ocorre em anos eleitorais, regra não escrita autoriza o ritmo lento nas duas casas. Fala-se até em recesso branco. O adjetivo - que qualifica o período em que deputados e senadores abandonam os gabinetes para entrar na disputa dos respectivos estados - adoça a realidade.
    Trata-se de eufemismo que atenua fato pouco lisonjeiro: o parlamentar faz de conta que trabalha, o eleitor faz de conta que acredita, medidas importantes para o país ficam na fila de espera. Distante dos interesses nacionais, o foco de preocupação dos partidos é a manutenção e a ampliação do poder. A luta por cargos na Esplanada serve de pálida amostra do toma lá, dá cá em que se transformou a política.
    Neste ano o quadro ganha cores pesadas. Com a Copa do Mundo disputada no Brasil, o tempo dá a sensação de ter ficado mais curto. Não se trata apenas dos dias que se estendem da abertura ao final do campeonato. Fatos ligados ao certame exigem atenção especial. É o caso da segurança, da mobilidade, da recepção adequada às delegações e aos turistas que virão ao país - cujo forte não reside no planejamento.
    Não só. A economia parece sair dos trilhos. Inflação insistente obrigou o Banco Central a elevar os juros que repôs o Brasil no indesejável pódium dos campeões de taxas altas. De 7,25% em abril de 2013, a Selic saltou para 10,5% em janeiro de 2014 com indicativo de alta. Bancos estrangeiros revisaram a expectativa de crescimento do PIB - de 2% para 1,5%.
    Mais: a balança comercial registrou o pior mês da história: as importações superaram as exportações em US$ 4,06 bilhões. A indústria encolhe, com retração média de 0,3% por ano desde a posse de Dilma Rousseff. A inadimplência voltou atrás na tendência de queda e subiu 7,84% em janeiro. Esta semana, apagão em 13 estados e no DF jogou descrédito na política energética nacional.
    O cenário externo também preocupa. Entre os fatores que causam dor de cabeça, sobressaem a redução dos estímulos à economia americana, a desaceleração do crescimento chinês, a elevação dos juros dos países emergentes, que, além de empurrar a Selic para o alto, diminui a atração do mercado nacional. Sem ter feito a lição de casa apta a impulsionar a competividade, o Brasil se condena ao atraso.
    Ano eleitoral é sempre difícil. Com um olho nas urnas e o outro nas pesquisas, os governantes temem tomar medidas que lhes possam roubar votos ou reduzir apoios. A situação, porém, exige ação efetiva. Adiar providências urgentes cobrará preço ainda mais alto dos cidadãos. Impõe-se variar o foco. Em vez de mirar só as urnas, Executivo e Legislativo precisam se entender.
    Do Congresso, espera-se maior comprometimento com o país ao votar projetos que se traduzam em ganhos para a sociedade. Do governo, o real compromisso com o equilíbrio das contas públicas. Ajuste fiscal consistente ajudaria a controlar a inflação, abriria espaço para o BC reduzir os juros, a produção ganhar fôlego, o crescimento retomar o ritmo desejado. É vida além das urnas.