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sábado, 13 de julho de 2013

Protesto esvaziado - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR


As centrais sindicais não souberam ler corretamente as manifestações de junho, e isso explica a baixa adesão popular à greve geral de quinta-feira

    Anteontem, as ruas de diversas capitais foram tomadas de novo – não pelos manifestantes com máscara de Guy Fawkes e cartolinas escritas à mão, mas pelas centrais sindicais, com faixas “profissionais”, coletes e camisetas, bandeiras produzidas em série. Prometiam uma greve geral, que não veio, mas conseguiram parar pelo menos parte de algumas cidades, transtorno minorado pela atitude de patrões que dispensaram seus funcionários mais cedo para poupá-los de problemas na saída do expediente, já que estava prevista paralisação no transporte público justamente para o fim da tarde. Mas, mesmo vindo na sequência de manifestações que levaram milhões às ruas, o Dia Nacional de Lutas não empolgou os brasileiros na mesma proporção. As estimativas sobre o total de pessoas que participaram das passeatas variam de 80 mil a 100 mil pessoas, contra 1 milhão no auge da “revolta junina”. Por que tanta diferença de quórum?
    Que os sindicatos também têm o direito de ir para a rua é indiscutível – e foi justamente graças ao seu poder de mobilização que foram possíveis muitas conquistas dos trabalhadores no Brasil. Mas faltou, por parte das centrais, uma leitura mais cuidadosa dos protestos de junho. A pauta do Dia Nacional de Lutas ajuda a entender por que a greve geral de quinta-feira não empolgou tanto quanto as grandes passeatas do mês passado. Não tanto pelas reivindicações presentes – como o fim do fator previdenciário –, mas pelas ausentes. Pedidos de cadeia para os mensaleiros e corruptos em geral? Nem sinal. Críticas à maneira como Guido Mantega vem conduzindo a economia? Pedidos por reforma política, eleições limpas, moralidade no trato com a coisa pública? Quando estiveram presentes, foi de forma muito tímida. O colunista da Gazeta do Povo Rhodrigo Deda apontou a diferença de propósitos entre os protestos de junho e de quinta-feira: enquanto estes pediam benefícios para categorias de trabalhadores, aqueles queriam uma mudança nos valores da sociedade.
    Além disso, entre as entidades organizadoras e participantes do Dia Nacional de Lutas havia diversos grupos alinhados com o governo federal, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a União Nacional dos Estudantes (UNE) e o Movimento dos Sem-Terra (MST). Eles fizeram um grande esforço para poupar a presidente Dilma Rousseff no evento de quinta-feira, apesar da presença de centrais sindicais de oposição. É uma postura que também não colaborou para atrair aqueles que, em junho, gritavam “sem partido!” e criticavam o Planalto sem medo – e o volume dessas críticas ajuda a perceber que existe uma certa dissociação entre os anseios da sociedade como um todo e as plataformas dos sindicatos.

    Os sindicatos e o movimento estudantil sempre se destacaram por sua maestria na condução de manifestações populares, algumas das quais entraram para a história do país. Os protestos de junho, no entanto, mostraram uma nova dinâmica: apesar de iniciados por organizações com firmes posturas ideológicas, como o Movimento Passe Livre, eles escaparam da tutela dos movimentos “à moda antiga” e permitiram que a sociedade expusesse livremente e de forma difusa a sua própria pauta, a ponto de o MPL paulistano ter abandonado temporariamente a organização de passeatas alegando que elas haviam sido “sequestradas” por “conservadores”.
    Espertamente, o governo federal passou a invocar o “clamor das ruas” para tentar levar adiante sua própria agenda (como no caso da constituinte exclusiva para a reforma política), que não necessariamente coincidia com os pedidos nas manifestações; mas várias das reivindicações populares também foram atendidas, o que encoraja os sindicatos a também ir para a rua. Movimentos como o de quinta-feira são parte de sua tentativa de retomar o protagonismo que já tiveram – tentativa que, a julgar pelo tamanho da presença popular, começou frustrada. Mas, se os sindicatos souberem ler com mais atenção os anseios da sociedade brasileira, e incorporá-los à sua plataforma, poderão ter mais sucesso no futuro.