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quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A Vale lucra menos. E nós?

Lúcio Mário Pinto*
 
    A imprensa e o mercado classificaram como "fraco" o desempenho da antiga Companhia Vale do Rio Doce no terceiro trimestre deste ano. O lucro da empresa no período caiu 57,8% em relação ao mesmo trimestre do ano passado. A retração foi menor, mas de qualquer modo expressiva, comparativamente ao 2º trimestre de 2012: queda de 37,4%. Na relação dos nove primeiros meses deste ano com igual período de 2011, a redução se manteve alta: o lucro foi menor 48%.
    Em termos absolutos, os números são capazes de abalar o mercado de capitais, onde a Vale é figura de proa, e a balança comercial do Brasil, que a tem como líder. Mesmo com toda a diminuição apontada, no entanto, o lucro da Vale, a segunda maior mineradora do mundo, foi de 3,33 bilhões de reais no 3º trimestre (quando seu faturamento alcançou R$ 22,2 bilhões, apenas 7% menor do que no trimestre anterior) e de 15,32 bilhões nos nove primeiros meses do ano. Um rendimento apreciável em qualquer lugar do mundo, em qualquer época, para qualquer produto.
    Menos nas bolsas de valores. Elas foram acostumadas, durante a década de Roger Agnelli na presidência da Vale, a tirar da mineradora o máximo de dividendos. A CVRD foi a empresa que mais os distribuiu em todo mundo, em 2005.
    Os retornos foram crescentes e fabulosos para os detentores de ações da companhia, sobretudo os jogadores financeiros de Wall Street. A obsessão por resultados com os papeis obscureceu a sua dimensão produtiva. Daí a decepção dos que dela extraíam os seus ganhos.
    Quem lida com minérios sabe que essa é uma atividade cíclica. Ora os preços sobem, ora caem. Também a produção pode crescer desproporcionalmente, gerando estoques imensos, que rebaixam os preços, ou escassear a ponto de levar a uma pressão inflacionária dos valores envolvidos nessas transações.
    Por isso, uma mineradora precisa se orientar por diretrizes de longo prazo, com estratégias de maturação duradora. Não se trata de mercado de varejo, como sugere a distorcida programação publicitária da Vale. Ela é massiva não para seduzir o comprador do seu minério, com o qual assina contratos de longo prazo. Seu alvo é a opinião pública, o governo e outros agentes de influência na sociedade através de grupos de pressão.
    Parece que agora o minério de ferro, o principal produto da Vale e da pauta de exportações do Brasil, entrará num ciclo descendente. Por causa da gula chinesa, os preços chegaram a um patamar nunca antes alcançado, como diria o ex-presidente Lula, acima de 150 dólares a tonelada. É natural a inflexão para baixo (agora em torno de US$ 100 a tonelada), embora não mais para os níveis praticados quando Carajás entrou em produção, em 1985 (US 15/25).
    O perigo está na hipótese de a Vale procurar compensar o "fraco desempenho" de agora, que se refletirá na receita e no lucro, rejeitados por um mercado faminto pelos rendimentos financeiros, aumentando ainda mais a produção.
    A nova mina ao sul de Carajás, no Pará, que entrará em operação para dobrar a produção, segue nesse caminho. Trata-se de investimento ainda maior do que o que levou à implantação da primeira mina. Mas é um caminho nada desejável para o país e o Pará. Logo esgotará a maior mina de alto teor de hematita do planeta. É provável que ela chegue à exaustão em mais 80 anos, quando se esperava inicialmente que sua vida útil durasse 400 anos
    Para que essa opção não se consolide, é preciso discutir a questão imediatamente, não deixando que a empresa tome decisão isolada e voltada para seus apreciadores financeiros. Carajás é uma das joias mais preciosas do subsolo brasileiro, encravada a quase 900 quilômetros do litoral do Maranhão, por onde 80% da produção é embarcada com destino à Ásia, 80% dela para a China.
    Carentes de minério de ferro rico para sua poderosa siderurgia, responsável por 30% do aço do mundo, os chineses pagaram caro para se assenhorearem dessa incomparável matéria prima amazônica. Agora estão colhendo os frutos dessa decisão: contam com um minério de elevada concentração para o dia a dia dos seus altos fornos e com estoques crescentes para o futuro — que será deles e não nosso.
* Lúcio Mário Pinto é editor do Jornal Pessoal, semanário do Pará.