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A delicada convivência de um Executivo de esquerda com um Congresso majoritariamente conservador e um Supremo Tribunal Federal (STF) progressista, ou “iluminista” como gosta de dizer seu futuro presidente, o ministro Luís Roberto Barroso, está ficando a cada dia mais problemática. A composição do ministério, que deveria ser uma representação partidária das forças políticas que venceram as eleições do ano passado, passou a ser uma miscelânea ideológica de difícil compreensão para quem gostaria de ver uma “frente ampla” governando.
Partidos comprometidos com o bolsonarismo até o último dia de governo ganharam força política para indicar ministros e dirigentes de estatais, mesmo continuando a votar contra o governo. A convivência entre estranhos está pautada por acordos congressuais que levam um governo dito de esquerda a não conseguir fazer valer posições suas, como aquela sobre o marco temporal das terras indígenas.
Em troca de não fechar questão contra a tese, permitindo que partidos que fazem parte de sua base no Congresso votassem a favor, o governo garantiu o compromisso de aprovação do arcabouço fiscal. Diferentemente do que aconteceu quando conseguiu o apoio de partidos de direita por meio do mensalão, hoje os “aliados” têm força parlamentar para questionar o Executivo e não se contentam apenas com verbas e cargos. Querem isso e mais defender suas propostas.
Por isso ficaram com Bolsonaro até o final, quando muitos pensavam que adeririam a Lula logo que sentissem os ventos da vitória da esquerda. Esses ventos só chegaram quando as urnas se abriram. E eram fracos. Uma vitória da esquerda por poucos milhares de votos não colocou a direita congressual num corner. Num Congresso de centro-direita, medidas para conter o déficit fiscal são bem-vindas, mas as pautas de valores sociais são sempre difíceis de passar.
O projeto de lei que o Congresso aprovou para restabelecer a tese do marco temporal a partir da Constituição de 1988 para as terras indígenas simplesmente não vale. O STF já decidiu a questão contrariamente, e o Congresso só pode mudá-la via Proposta de Emenda Constitucional (PEC). A partir do momento em que o STF definiu que a tese não pode ser adotada, decidir o contrário é inconstitucional. O STF será acionado e terá de dizer que é ilegal.
Um detalhe dessa disputa entre Congresso e STF é que ela é ideológica. As discussões são todas baseadas em valores — liberação da maconha, aborto, terras indígenas —, questões que a direita preza muito e que o STF tem decidido por meio de um olhar progressista. O Supremo só está agindo porque o Congresso nunca tentou fazer leis sobre essas situações. Faz agora, que os temas são tratados pelo Supremo, acionado por organizações não governamentais ou políticos.
O Congresso é majoritariamente conservador, mas não tem maioria de dois terços para aprovar uma emenda constitucional. Os parlamentares farão barulho, haverá disputa institucional, dificuldade para administrar a crise, mas, na verdade, só com uma PEC o Congresso poderá mudar alguma medida tomada pelo STF. Se o Congresso não legisla sobre temas delicados, como o casamento homoafetivo ou aborto, o Supremo decide.
Diante das medidas “progressistas” aprovadas, as forças conservadoras tentam revertê-las. A ministra Rosa Weber, de saída da presidência do STF, fez questão de dar seu voto a favor da autorização do aborto até 12 semanas de gravidez, enquanto na Câmara há projetos que tentam proibi-lo até mesmo nas situações em que hoje é permitido, como em caso de estupro ou de fetos anencéfalos.
Importante reforçar que o STF não mudou nenhuma medida aprovada pelo Congresso. Se tentasse, seria, aí sim, influência indevida, como o presidente Lula tentou fazer com a estatização da Eletrobras, assunto já decidido pelo Congresso que o Executivo pretendia reverter.
Certamente iremos encontrar dezenas, talvez até centenas de respostas, mas qual delas é de fato a verdadeira? Fomos aplicando está palavra aleatoriamente em tudo que víamos pela frente, houve tempos que ela soava até com uma certa distinção, dando a entender que uma pessoa com cultura era uma pessoa bem relacionada socialmente.
Confesso que ando meio cismado com sua real importância, ou talvez queremos aplicar uma nova cultura na existente. Os shows realizados com atrações apelativas costumam agradar muito mais o público. Pra lá a multidão se dirige e se divertem, não pense que vai só pessoas bobas, vai todo mundo. Então, não será esta a nossa verdadeira cultura?...Se o povo vai ao delírio nestas apresentações e dão as costas ao trabalho sério, bem elaborado.
Como posso afirmar que meu trabalho é cultural se 99% dos habitantes de minha cidade desconhecem a minha produção e nem sequer se mostram interessados em conhecer. É justo eu dizer que ele é cultural? Quando a palavra designa aquilo que faz parte das pessoas. Evidente que meu trabalho está fora dessa classificação.
Embora a cultura seja um processo dinâmico, me parece que ela precisa passar pela mídia para que o povo possa apreciar. Esse é o caminho natural apontado pelas regras do mercado. Um segundo caminho seria possível se os gestores tivessem compromisso verdadeiro com os artistas de sua terra. Primeiro colocando na pasta pessoas competentes e seguras da responsabilidade para com o cargo, depois desenvolvendo atividades juntos com a educação.
É lá nas escolas que encontramos um público capaz de mudar essa realidade, de se transformar no futuro numa plateia que saiba discernir o sofisticado do grotesco. A própria cultura precisa ser inserida na metodologia de ensino, tornando-se parte fundamental das instruções educacionais. Para que a produção dos artistas possam, enfim, influenciar na construção cultural. Somente assim teremos êxito, derrotando essa mídia interesseira acionada por um mercado cada dia mais sedento de lucro. Z T
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Todos os empregados formais de Araguainha trabalham na prefeitura. O que significa que um terço dos mil moradores da pequena cidade de Mato Grosso está pendurado na folha de pagamento do município. Não é um caso isolado. A um ano das eleições municipais, a maioria das cidades brasileiras aumentou suas despesas com a contratação de funcionários.
De 2022 para cá, 4.681 municípios aumentaram os gastos com pessoal no primeiro semestre do ano, o que representa 84% das cidades do País. Esse aumento é crescente. A cada ano, o gasto com folha salarial nas prefeituras sobe. Em 2019, nas vésperas das últimas eleições municipais, a despesa era 46% menor do que atingiu agora.
Os municípios nunca receberam tanto dinheiro do governo federal, mas não têm atacado as principais necessidades da população. Um volume de recursos recorde que poderia reduzir significativamente as desigualdades no País. Mas o que os prefeitos estão fazendo com tanto dinheiro? Investindo em saneamento básico, escolas, saúde? Não. Estão contratando gente.
O Estadão percorreu 2.312 quilômetros, passando por 15 cidades do Distrito Federal, Goiás e Tocantins, para responder por que o País é tão desigual mesmo com tanto dinheiro. Grandes investimentos feitos no passado criaram ilhas de riqueza e bolsões de pobreza em volta, como mostrou a primeira reportagem da série “Desigualdade - O Brasil tem jeito?”.
O prefeito de Araguainha, Francisco Naves (União), admite que o número de funcionários do município cresceu nos últimos 12 meses e está “chegando a 300″. Só nos primeiros meses deste ano, foram R$ 4,1 milhões para bancar os servidores, valor equivalente a 64% de todos os recursos que a prefeitura recebeu do governo federal no período.
A cidade não usa o dinheiro que recebe de Brasília para investir em saúde, educação e melhoria urbana. Araguainha não tem infraestrutura de asfalto, bueiro e calçada, segundo o IBGE. Só 5,5% da população têm esgoto tratado, não existe creche e, nas palavras do próprio prefeito, a única escola está “caindo aos pedaços”.
Também não há previsão de planos de geração de renda. E por que ele contrata gente ao invés de investir na escola? O prefeito alega que já herdou uma prefeitura inchada e admite que vai substituir os que estão se aposentando, perpetuando assim a situação.
É em Araguainha que está o maior buraco aberto por um asteroide na América do Sul. Há mais de 200 milhões de anos, um meteoro caiu ali e formou uma cratera do tamanho equivalente a 140 campos do Maracanã. O governo tinha dinheiro, mas não desenvolveu um projeto para atrair turistas e pesquisadores. “A prefeitura está superlotada de funcionário. Não sobra dinheiro para nada”, diz o prefeito.
A conta do aumento de funcionários deve ficar para o governo federal. O prefeito Francisco Naves avisa que chegará a Brasília no próximo dia 3 de outubro para pedir mais dinheiro à União. Ele fará parte de uma mobilização de quatro mil gestores municipais que alegam problema de caixa e chamam a romaria de “greve”.
A queixa dos prefeitos encobre um dilema. Os municípios gastam cada vez mais dinheiro federal com folha salarial e querem quitar esse valor com recursos federais. Nos primeiros seis meses deste ano, as prefeituras gastaram R$ 208,5 bilhões com servidores públicos, 16% a mais que no mesmo período do ano passado. O valor supera todo o repasse do governo feito para os municípios no semestre, um total de R$ 156 bilhões. Na prática, o gasto com funcionários das prefeituras é tão alto que o repasse da União já nem dá conta de pagar a fatura.
A penúria de Araguainha se repete em outros municípios. Em Ouro Verde, Goiás, a diarista Benoir Soares, 45 anos, espera há mais de um ano para fazer uma cirurgia e retirar um cálculo da vesícula, diagnosticado em um exame que fez. Não há unidade de saúde com condições de fazer a cirurgia na cidade, um dos bolsões de desigualdade do Brasil, a 61 quilômetros de Goiânia. “Dizem que essa pedra silenciosa é a perigosa, pode dar crise a qualquer momento”, afirma. “Foi trocando de prefeito e tiraram o hospital que tinha aqui”, diz Benoir.
Além da falta de hospital, a população de Ouro Verde, de quatro mil habitantes, vive com R$ 424 por mês em média. Para a folha de pagamento dos funcionários municipais, no entanto, são gastos R$ 13 milhões por ano, considerando as despesas dos últimos 12 meses até abril de 2023, valor equivalente a 80% dos repasses federais feitos para a cidade no mesmo período. A prefeitura foi procurada, mas não retornou à reportagem.
Enxugar a folha de pessoal é um dilema. Muitos prefeitos devem disputar a reeleição ou tentar eleger aliados para o comando das prefeituras. O que os políticos locais pedem é mais dinheiro para bancar obras e serviços eleitoreiros, além de manter a máquina com servidores, vários deles contratados como meros cabos eleitorais.
“Se continuar desse jeito, ninguém ganha eleição e nem adianta ser candidato”, diz o prefeito da cidade goiana de Jaraguá, Paulo Vitor Avelar (União). Ele também participará da marcha para Brasília. A prefeitura da cidade aumentou os gastos com folha de pagamento em 14% no primeiro semestre do ano, atingindo R$ 43 milhões, enquanto a população ainda convive com um lixão a céu aberto.
O País sustenta sete milhões de empregados na administração municipal atualmente, de acordo com dados da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). A organização dos prefeitos estima que menos da metade (44%) sejam profissionais da saúde e da educação. Os municípios alegam que a União tem onerado as prefeituras com pisos salariais, planos de educação e leis em diversas áreas sem repassar dinheiro suficiente para arcar com as despesas. Ainda reclamam que foram proibidos de conceder reajuste salarial durante a pandemia e, agora, precisam compensar seus servidores.
As mesmas prefeituras que pedem dinheiro do governo federal levam até 30 anos para revisar os próprios impostos municipais, como o IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana), de acordo com os tribunais de contas dos Estados.
“É muito cômodo para os municípios simplesmente receber recursos sem fazer o dever de casa”, afirma Alisson Diego Batista, professor de Administração da PUC Minas e secretário de Fazenda da cidade de Nova Lima (MG). “Muitos não cobram os impostos porque isso traz problemas eleitorais. Existe uma completa falta de planejamento, pouco compromisso com arrecadação própria e um discurso populista dos prefeitos.”
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que nenhuma prefeitura vai receber menos dinheiro do governo federal em 2023, em comparação ao ano passado. É um compromisso de garantir a manutenção do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), repassado pela União para as cidades brasileiras, sem nenhuma perda.
Na prática, mais uma vez o socorro virá da União. Não há, no entanto, nenhuma contrapartida que outros gastos essenciais sejam feitos pelos municípios.