terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Foliões excluídos - LEONARDO BRUNO

A notícia chegou como apenas mais uma mudança de regulamento: o desfile das escolas de samba teve seu tempo reduzido, assim como o número de alegorias. Mas a modificação nas regras do jogo esconde uma consequência perversa. Para passar pela avenida mais rapidamente, as escolas tiveram que reduzir seus contingentes, cortando entre 8% e 10% do total de componentes. Assim, no Grupo Especial de 2017, passarão pela Sapucaí cinco mil pessoas a menos.
Para presidentes e carnavalescos, a notícia pode até ser boa: afinal, menos gente significa gasto menor, o que é música para os ouvidos nestes tempos de crise. Mas, para o futuro da festa, o resultado é preocupante. Estamos alijando uma multidão do palco principal de nossa maior manifestação popular. Numericamente, é como se uma escola e meia deixasse de se apresentar no Sambódromo.
O problema é que as escolas de samba vêm enfrentando uma severa crise de popularidade nos últimos anos. Os ensaios nas quadras estão cada vez mais vazios, os ingressos já não se esgotam como antigamente, os convidados dos camarotes estão mais atentos aos shows dos DJs do que aos puxadores e passistas, as agremiações têm menos presença na vida cultural da cidade. Nesse contexto, o dever de casa é tentar atrair mais gente, mostrando as delícias de vestir a fantasia e chegar em êxtase à Apoteose. Mas, ao contrário, as escolas cortaram foliões. Golpe duro.
Chegou o momento de o carnaval repensar sua relação com o público. A noção de “comunidade”, ainda repetida exaustivamente, existe apenas por herança de um tempo distante, quando os grêmios recreativos tinham relevância dentro de suas regiões, com eventos e encontros que mobilizavam a vizinhança. Ali sim existia uma “comunidade”. Hoje, são poucas as escolas que abrem as quadras para outras atividades que não seus ensaios comerciais.
Ao mesmo tempo, desfilar virou uma prova de amor à bandeira. Fantasias pesadíssimas, enredos insossos, obrigatoriedade de ensaios exaustivos, alas com lugares marcados (que impedem a espontaneidade do folião) e diretores de harmonia agressivos afastaram muitos amantes do samba. Além disso, assistir ao espetáculo em arquibancadas desconfortáveis (e sem proteção contra a chuva) também não é uma opção atraente. A soma desses fatores afastou boa parte dos leigos que se interessavam pelos desfiles — que virou hobby quase exclusivo de uma pequena legião de fanáticos.
Dado esse diagnóstico, é necessário um movimento de retomada que atraia os foliões para dentro das escolas (e do Sambódromo). Quadras com atividades o ano inteiro, fantasias apropriadas para “brincar o carnaval”, em alas que não pareçam uma parada militar, conforto para o público que está assistindo. É preciso agir para resgatar antigos admiradores da festa e criar as novas gerações de sambistas. Neste momento em que as escolas de samba estão em xeque, a pior alternativa é excluir gente dos desfiles. Os cinco mil que saíram este ano podem não voltar nunca mais.


*Leonardo Bruno é jornalista