sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Geraldinho Carneiro é canonizado marginal

Para o novo imortal, que pertenceu à ‘geração mimeógrafo’ nos anos 1970, ABL celebra rupturas literárias e as transforma em tradição

Qual é a sensação de ser eleito para a ABL?
Muito feliz. Os acadêmicos já haviam me avisado que havia uma grande expectativa, que agora se confirmou. É uma alegria estar perto de tantas pessoas que gostava de consultar através de livros. Agora poderei consultá-las pessoalmente.
O presidente da ABL, Domício Proença Filho, disse que sua eleição representa uma renovação para a instituição. O senhor é, aliás, o primeiro expoente da geração da poesia marginal, que se formou nos anos 1970, a se tornar imortal...
É verdade. Mas, por outro lado, sempre me considerei um marginal entre os poetas marginais. Apesar de a queridíssima Heloisa Buarque de Hollanda, que admiro muito, ter cunhado esse termo, acredito que, na nossa época, havia populações que mereciam essa denominação mais do que nós, que vínhamos da classe média e tínhamos mais recursos. Mas acredito que toda poesia é marginal, porque a poesia sempre se insurge contra o discurso do poder. Nesse sentido, espero que minha escrita continue sendo marginal.
E como manter essa marginalidade em um ambiente mais formal como a ABL?
Isso é, de fato, muito curioso. A academia tem, em sua história, figuras que caminharam na marginalidade política, como Tomás Antônio Gonzaga, um dos meus heróis. A casa tem como fundador Machado de Assis, um dos maiores transgressores da literatura, e elegeu como patronos figuras como Castro Alves. Então, a ABL vem exercendo uma função dupla: canonizar as rupturas e transformá-las em tradição.
O senhor é um autor múltiplo, traduz Shakespeare, publica poesia, mas também faz letra de música. O que achou do Nobel para o cantor e compositor Bob Dylan?
Foi um prêmio muito merecido. É um dos maiores poetas do século XX. A poesia, originária dos gregos, também era muito próxima da música. Achei curiosa essa resistência à escolha dele. Eu tinha dois livros do Dylan, e os dois me foram roubados lá de casa. O que prova que é um grande poeta.